sexta-feira, 31 de outubro de 2014

BRAÇO-DE-FERRO, CORAÇÃO DE MACELA.

CRÔNICA DO PROFESSOR
BRAÇO-DE-FERRO, CORAÇÃO DE MACELA.
PROFESSOR MÁRIO MÁRCIO DE QUADROS


            Orientadora de profissão. Aplicada aos quefazeres, por natureza. Habituada a revelar-se no silêncio do olhar que se fez na presença mágica do caminho, na química do encontro, no encanto pessoal, nos segredos da bondade. É a favor do diálogo; do encontro cuidadoso, acordado no equilíbrio das relações humanas. Num português vivo, firme e aberto à plenitude da existência, traz o abraço amigo no aperto de mãos, prosa e poesia no brilho do olhar, um canto de raiz no coração.
            Nesses quinze anos passamos juntos à caça do saber. Trocamos ideias a respeito dos rumos da educação na Escola Estadual Henrique Diniz, a de Jovens e Adultos, sobretudo. Sempre apresentou muito carinho e apreço pela EJA. Sempre destinou parte de sua perícia e afeto profissional ao Projeto. Sabe dos problemas habituais que cada aluno, professor e funcionário enfrentam para estudar e trabalhar à noite. Por isso, se dispôs a ajudar a todos, indistintamente. (Aliás, faz parte de sua vida acolher as pessoas.) Todos na Escola ganham importância e visibilidade com seu trabalho de servidora pública que respeita o público. (Coisa rara hoje em dia: ética e competência profissional numa só pessoa).
             Essa sua atitude, aparentemente simples, fez diferença enorme na vida das pessoas envolvidas com a EJA. Seu sorriso remove montanhas, e quebrou barreiras do preconceito ao Projeto. Em nenhuma outra instituição da SRE de Barbacena a Educação de Jovens e Adultos é tão valorizada como aqui na nossa Escola. Devemos isso a você, Terezinha. Você que incentiva o trabalho em equipe e nos diverte com sua agradável presença, comprova: “não somos nada sem os outros”. E com um sorriso nos olhos e equilíbrio no coração, nos sugere que o sucesso da EJA deva ser atribuído a cada um de nós: professor, aluno, direção e funcionário. Para que a escola realize e faça a diferença é preciso que todos resolvam sua parte; e estejam dispostos a trabalhar para transformar sonhos em realidade. Você defende essa tese. E, sem dizer palavras, articula: “só vamos construir castelos na areia se não assentarmos seus alicerces na realidade da Comunidade Escolar”.
            Em seu modo de ver, o aluno não é um dado estatístico a ser contabilizado ou um número da chamada, simplesmente. Ele é uma pessoa que será recebida por você em nome da escola, em sua inteireza física, social e humana. Identificar indivíduos pelo nome e sobrenome; cobrar deles participação e compromisso ao projeto; conquistar a disciplina escolar na dialética do argumento; pensar calendário de provas; reuniões pedagógicas e conselhos de classe; taletas e fechamento dos diários; apresentação dos resultados parcial e final das turmas; reunir-se com pais, alunos, direção, professores, funcionários; coordenar o PEAS. Inúmeras atribuições para uma pessoa que, ao assegurar o andamento eficiente do trabalho coletivo, se mantém anônima. Discreta no seu canto, mas em paz consigo mesma.
            Profissionalmente já estive à beira do abismo na arte do educar. Sentindo-me condenado às favas, dentro e fora da sala de aula. Mas hoje posso dizer orgulhosamente e com brilho nos olhos que, a exemplo de meus colegas, contei com o carinho e o respeito profissional da Terezinha para me erguer do chão. Sempre disposta a ajudar e a oferecer o ombro amigo, a quem quer que seja; em defesa do bom senso, do profissionalismo e do entendimento humano. Que eu tenha lembrança, ela nunca discriminou ou fez diferença entre essa ou aquela pessoa. (Sua história é pautada pela inclusão, sempre foi.) E jamais se intimidou, ou se deu por vencida, quando desafiada pelos ossos do ofício. E detalhe: nunca perdeu o enfoco, o bom senso e a disposição para trabalhar.
            Nós, seus discípulos, nos orgulhamos de conviver com ela no ambiente escolar. Sua firmeza de caráter e disposição para o trabalho recarrega nossas baterias para o encontro diário com os alunos. E toda aquela nossa insegurança de relacionamento e falta de empatia em algumas turmas é vencida imediatamente, quando sentimos sua presença motivadora e amistosa ao nosso lado.

            Engraçado. Quando há mais de trinta anos me arrisquei no Magistério, soube que precisaria mirar o fundo da sala, para me sentir à vontade e resguardado diante da turma, sobretudo no primeiro dia de aula. Por muitos anos fiz isso. Tentei não olhar nos olhos dos alunos, receando não me sustentar de pé diante deles. Isso dez, quinze anos depois de me estabelecer no ensino.
            Ledo engano! Não é que a Terezinha virou toda minha certeza de cabeça para baixo!
            Ao contrário do que vinha fazendo, ela me disse para olhar nos olhos dos colegiais; e dizer a eles que eu era, e sempre seria um aprendiz a vida inteira. E estava ali, à frente da sala, para celebrar a mágica dessa revelação. Confesso que cheguei a desconfiar dessa sua fala. Mas, uma, duas semanas depois, eu estava me sentindo o próprio Fernão Capelo Gaivota, ave idealista de Richard Bach que descobriu um propósito para seus voos. Um pária que, ao contrário do bando, voava pelo simples prazer de voar. E aprendeu com o tempo que “vê mais longe a gaivota que voa mais alto”. E voa mais alto quem tem um propósito na vida.
            Você é a EJA, Terezinha. E a EJA é você.
           









                                                                                                                                       Barbacena, 30/07/2014.

            

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