sexta-feira, 24 de setembro de 2010

 De passagem...
Mário Márcio de Quadros





Há uma mulher na janela,

Um menino na calçada

E um par de chinelos no meio da rua.



São João Del-Rei,  1984..

Crônicas do Professor

DOUTRINAS SOCIAIS:
CAPITALISMO VERSUS CAPITALISMO
Professor Mário Márcio de Quadros
           

            Desde a queda do Muro de Berlim (1989) e o desmembramento da União Soviética (1991) tem-se a idéia de que o Capitalismo “venceu” a guerra fria: a disputa política e ideológica empreendida entre os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Esses dois eventos marcariam o fim do socialismo? Não acredito!
            As mudanças históricas não são o resultado apenas de marcos cronológicos. Não foi a derrubada de um muro ou o desmembramento de uma “união” que acabou com o socialismo. Esse sistema, da forma como nasceu, estava mesmo fadado ao fracasso.
            A idéia de propriedade coletiva dos meios de produção, de uma economia “planificada” e destinada ao bem-estar da coletividade, não ocorreu de fato. Os bolcheviques em nome da “classe trabalhadora” tomaram o poder. E nele permaneceram em nome da vaidade pessoal de seus membros. Silenciaram os sovietes[i]. Deixaram de ouvir o povo...
            Claro, uma ou outra mudança positiva aqui e ali ocorreu: os trabalhadores tiveram acesso a terra. Seus filhos e netos estudaram. Obtiveram entrada à assistência médica e odontológica, mas... Em nome do culto à personalidade das lideranças, alimentados por certezas dogmáticas, não admitiam sequer a hipótese de serem questionados. Torturavam e matavam quem se opunha à forma como estava sendo conduzido o regime comunista do “partidão”.
            É possível que a autocracia[ii] tenha carcomido (destruído) em suas bases o ideal socialista: ser a grande força de transformação social da classe trabalhadora. Aliás, a liderança do Partido Comunista se comportava como os burgueses: cultivava a “passividade do proletariado”. Para ela, o ensino tradicional, por exemplo, criaria pessoas submissas, que jamais desobedecem aos patrões e ao governo.
            O sistema socialista de um estado ubíquo[iii] e onisciente[iv] se fazia ouvir pelo terror da tortura física e psicológica de seus opositores. O terror da “mão invisível” de um governo autólatra[v], dono e senhor absoluto da verdade...
            Embora condenado ao fracasso pelo narcisismo[vi], repressão e domínio ideológico, o socialismo não morreu. A queda do muro e o desmembramento da União Soviética apenas assinalaram uma nova fase da economia mundial.
            De certa forma, a aparente vitória do sistema capitalista só ocorreu porque houve certa conjugação e incorporação de ingredientes marxistas a esse sistema. O trabalhador continua sendo explorado pela burguesia, mas é menos... Continua alienado[vii], mas é menos que antes... No Capitalismo, o direito à vida, à liberdade e à propriedade tem sido estendido a todos os indivíduos. A situação da classe trabalhadora tem melhorado. Há empresas, inclusive, que dividem parte de seu lucro com seus funcionários. E não é porque o burguês deixou de ser burguês, não. A verdade é bem outra: operários bem remunerados são operários felizes. E gente feliz produz mais. Gera mais lucro. Lucro que será dividido com a classe trabalhadora. Com mais dinheiro no bolso, o operário gasta mais, e tem mais conforto. Vivendo melhor, o trabalhador [menos alienado] nem vai se lembrar de conflito de classes ou da desigualdade social. E... Viva o “socialismo”!
Barbacena, 24 de setembro de 2010.


[i] Conselho celebrado por diversas pessoas.
[ii] Governo de um príncipe, com poderes ilimitados e absolutos.
[iii] Que está ao mesmo tempo em toda parte, onipresente.
[iv] Que sabe tudo, onissapiente.
[v] Que ou quem tem autolatria. Culto de si mesmo. Amor-próprio excessivo.


[vi] Amor excessivo a si mesmo.
[vii] Processo ligado essencialmente à ação, à consciência e à situação dos homens, e pelo qual se oculta ou se falsifica essa ligação de modo que apareça o processo (e seus produtos) como indiferente, independente ou superior aos homens, seus criadores.