terça-feira, 1 de junho de 2010

Filosofia: "A invenção da ética"

“A invenção da ética”
Pablo Capistrano
                [...] o Sócrates grego era mestre em fazer surgir idéias, como as crianças que sua mãe, parteira de profissão, ajudava a vir ao mundo. Sócrates se tornou uma espécie de “santo da filosofia” através da descrição que Platão fez de sua condenação e de sua execução. Nesse sentido, comparações entre Sócrates e Cristo são inevitáveis.
                Os dois são personagens trágicos. Ou seja, tanto os evangelhos canônicos quanto os diálogos de Platão que falam sobre a morte de Sócrates utilizam a estrutura das tragédias gregas. A morte de alguém muito superior a todos nós. A via-crúcis de Jesus, assim como os momentos finais de Sócrates na prisão, à espera da cicuta que o matará, tem grandes semelhanças com a forma básica da tragédia descrita por Aristóteles e causa o mesmo impacto psicológico.
                O happy end da ressurreição e o discurso presente no Fédon (diálogo que descreve os momentos finais de Sócrates) aliviam um pouco o peso trágico dessas duas histórias. Sócrates morre sereno. Ele demonstra que todo seu esforço filosófico foi o de se preparar para a morte e de construir um trabalho espiritual e mental que o deixasse firme, pleno e tranqüilo diante do derradeiro instante. Sua superação da fragilidade dessa vida se encontra na investigação sobre a própria vida. 
Sócrates pensou sobre o homem. Ele inverteu o curso da pergunta dos primeiros filósofos.
Se antes a grande questão da filosofia era “O que é isso que constitui a natureza? Depois de Sócrates a pergunta passou a ser “O que é isso que constitui o homem?”
                Sócrates inventa a ética porque propõe uma investigação sistemática acerca da Justiça, do Bem, da Linguagem, da Virtude. Antes de saber como a natureza funciona, o homem deve pensar sobre o que realmente é importante nessa vida. Antes de mergulhar nos limites do universo, o homem deve saber dos seus próprios limites. “Conhece a ti mesmo.”
                A percepção dessa frase induz Sócrates a uma intuição básica. O papel da filosofia é preparar o homem para a morte, e para que o homem possa se preparar bem para a morte é necessário que ele conheça a si mesmo, que reconheça seus limites, sua própria ignorância e que pratique um tipo particular de esporte: a maiêutica [o parto das idéias].
                Essa é a arte de conseguir, por meio de perguntas e respostas, fazer surgir a verdade que habita cada um, mas que, por arrogância e presunção, não conseguimos escutar. Calamo-nos para essa voz interior. Fechamos os olhos para não enxergar nossa própria condição. Esquecemos nosso ser, trancamos a janela para a luz de nossa casa não iluminar a rua. Mergulhamos na banalidade do mundo e nos surpreendemos quando a morte chega e diz: “Cartão vermelho! Fim de jogo pra você!”
                A virada ética de Sócrates começa quando surge a idéia de que não importa quão grande forem os mistérios do mundo, mais importante é encarar os mistérios de nossa curta e limitada existência. (CAPISTRANO, Pablo. Simples filosofia: a história da filosofia em 47 crônicas de jornal. Rio de Janeiro: Rocco, 2009. Pp. 49-51.)
1. O discurso presente no Fédon (diálogo que descreve os momentos finais de Sócrates) alivia um pouco o peso trágico de sua morte, por quê? Justifique sua resposta com partes do texto.
2. Sócrates inverteu o curso da pergunta dos primeiros filósofos. Que inversão foi essa?
3. Por que, segundo o autor, Sócrates inventa a ética?
4. “Conhece a ti mesmo.” A percepção dessa frase induz Sócrates a uma intuição básica. Qual?
5. Para Sócrates o que é mais importante na vida? E para você, o que é mais importante?

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